Prototipação e avaliação de um módulo Lora UG2AG para monitoração de sensores enterrados com utilização na agricultura digital

Autores

Palavras-chave:

agricultura de precisão, Internet das Coisas Subterrâneas, WUSN

Resumo

Introdução: As redes de sensores subterrâneos sem fio (WUSN – Wireless Underground Sensor Network) têm grande potencial para fornecer dados em tempo real à agricultura digital e a outras indústrias, sem expor sensores e infraestrutura de comunicação a danos. No entanto, Hardie e Hoyle (2019) destacam que o solo impõe desafios à comunicação por rádio devido às suas propriedades dielétricas e ao teor variável de água, e, embora as tecnologias de rede de área ampla e baixo consumo de energia (LPWAN – Low-Power Wide Area Network) sejam amplamente utilizadas em aplicações sobre o solo, ainda carecem de exploração em ambientes subterrâneos. Em seu estudo, os autores desenvolveram um banco de testes com módulos baseados em tecnologia LoRa (Long Range) de 433 MHz para avaliar a comunicação subterrânea in situ, tanto UG2UG (Underground-to-Underground) quanto UG2AG (Underground-to-Aboveground), em quatro tipos de solo, verificando que a distância máxima de transmissão UG2UG variou de 4 a 20 m e que a comunicação UG2AG atingiu 100 a 200 m, influenciada pela profundidade de enterramento, potência do transmissor, taxa de dados, modelo de antena e propriedades do solo. Com melhorias no gerenciamento de energia, os autores apontam a viabilidade de desenvolver WUSNs UG2AG baseadas em LoRa de 433 MHz para aplicações agrícolas, enquanto aplicações UG2UG ainda apresentam desafios consideráveis. Borrero e Zabalo (2020) desenvolveram e avaliaram um sistema de baixo custo com tecnologia LoRa para transmitir parâmetros agrícolas como umidade relativa, temperatura do ar, luminosidade, umidade e condutividade elétrica do solo, obtendo consumo energético inferior ao de sensores comerciais e uma duração estimada de bateria de 724 dias, com medições a cada 30 minutos. Esforços recentes na automação de processos agrícolas, conforme relatado por Ahumada et al. (2019), evidenciam dificuldades relacionadas à falta de redes de comunicação e energia elétrica em áreas remotas, embora a recente expansão de redes LPWAN e controladores de baixo consumo esteja criando novas perspectivas para a automação escalável de irrigação agrícola. A Internet das Coisas Subterrâneas (IoUT – Internet of Underground Things) e as WUSNs emergem como tecnologias fundamentais para medir e transmitir dados ambientais, otimizando o crescimento das culturas e a gestão hídrica, como observado por Cariou et al. (2023), que destacam o potencial dos sensores enterrados mesmo sob tráfego agrícola, embora ressaltem que ainda há desafios científicos e tecnológicos a serem superados, como o funcionamento adaptativo dos módulos frente às condições do solo e a minimização do consumo de energia. Além disso, abordam abordagens alternativas de coleta de dados, como relés estáticos de solo, robôs móveis e veículos aéreos não tripulados. Moiroux-Arvis, Cariou e Chanet (2022) também reconhecem as perspectivas promissoras para agricultura e monitoramento ambiental, mas alertam para as dificuldades impostas pela alta atenuação do sinal no solo e fatores como umidade, composição e profundidade dos nós. Em seus experimentos, alcançaram comunicações UG2AG superiores a 275 m utilizando módulos LoRa de 868 MHz otimizados, enterrados até 30 cm, demonstrando avanços relevantes para monitoramento agrícola. Em paralelo, Villarim, Villarim e Rodrigues (2023) analisaram a influência de variáveis como profundidade, distância e fator de espalhamento (SF) na comunicação UG2AG via LoRa, concluindo que melhor desempenho ocorre com visada direta, menor profundidade e maiores valores de SF, embora a comunicação se deteriore com o aumento da profundidade. Renzone et al. (2021) testaram a comunicação UG2AG em diferentes tipos de solo, observando que divergências entre estimativas e medições reais indicam a necessidade de novos estudos para aprimoramento dos modelos. Por fim, Silva et al. (2015) caracterizaram indicadores de qualidade de link (RSSI, LQI e PRR) em WUSNs, concluindo que o canal UG2UG apresenta estabilidade temporal, porém alcance limitado, enquanto o canal UG2AG, embora assimétrico, compartilha propriedades dos canais acima do solo, sendo o RSSI um melhor preditor de PRR do que o LQI. Diante desse cenário, este trabalho tem como objetivo prototipar e avaliar um módulo LoRa de comunicação sem fio subterrânea UG2AG, compacto e de baixo custo e consumo energético, para a monitoração de sensores enterrados com aplicação na agricultura digital. Metodologia: A seleção e aquisição dos componentes eletrônicos necessários para a manufatura dos módulos LoRa foi uma das etapas de desenvolvimento do projeto. Inicialmente, foi realizada uma análise detalhada para identificar os componentes mais adequados, considerando critérios como custo, tamanho e eficiência energética. A diversidade de opções disponíveis no mercado foi examinada, contemplando diferentes fabricantes, modelos e especificações técnicas. Após a seleção criteriosa, os componentes foram adquiridos, assegurando a qualidade e compatibilidade deles com o projeto. Essa fase garantiu que os módulos LoRa fossem montados com componentes de baixo custo, tamanho reduzido e principalmente de baixo consumo de energia, conforme as especificações do projeto. A montagem do módulo LoRa constituiu uma fase fundamental no desenvolvimento, integrando os componentes eletrônicos para formar um sistema funcional pronto para o início dos testes do código-fonte. Cada componente foi posicionado na placa de circuito seguindo o leiaute projetado e, posteriormente, soldados com técnicas apropriadas para garantir conexões elétricas sólidas e seguras, evitando danos a componentes sensíveis. Após a montagem física, testes iniciais foram realizados para verificar a funcionalidade dos módulos, assegurando que todos os componentes operassem conforme o esperado, estabelecendo a base para as fases subsequentes. Para o desenvolvimento do código-fonte, utilizou-se a plataforma Arduino IDE 2, possibilitando a criação de um código robusto e funcional para o microcontrolador. O processo contemplou a escrita estruturada das instruções, definição de parâmetros operacionais e depuração rigorosa utilizando as ferramentas da IDE, como inspeção de variáveis e execução passo a passo, garantindo o funcionamento correto do sistema. Após a validação do código, seguiram-se os testes funcionais dos módulos LoRa, divididos em dois tipos: teste de comunicação bidirecional AG2AG (Aboveground-to-Aboveground), com ambos os módulos acima da superfície em visada direta, e teste de comunicação bidirecional AG2UG (Aboveground-to-Underground), com um módulo acima da superfície e outro enterrado. Os testes foram realizados em campo aberto, em solo agrícola, buscando simular condições práticas de uso na agricultura digital. Para cada ensaio, foram previamente definidas as combinações de Potência de Transmissão (TxP) de 12 e 17 dBm, Fator de Espalhamento (SF) de 7 e 12, Largura de Banda (BW) de 250 e 500 kHz e Code Rate (CR) de 4/5 e 4/8, totalizando 16 configurações distintas. Cada configuração foi avaliada com a transmissão de 100 pacotes numerados em 100 rodadas, registrando-se os indicadores de intensidade do sinal recebido (RSSI) e de razão sinal-ruído (SNR – Signal-to-Noise Ratio), com três repetições para cada condição, visando garantir a confiabilidade dos resultados. Nos ensaios tipo 1, ambos os módulos foram posicionados acima da superfície do solo, sendo um deles fixo e o outro inicialmente próximo, transportado progressivamente até o limite de comunicação com visada direta. Nos ensaios tipo 2, um dos módulos foi enterrado a 40 cm de profundidade, enquanto o outro permaneceu a 2 m acima da superfície, também deslocado até a perda de comunicação, considerando duas condições de umidade do solo: seco e úmido. Esses ensaios foram planejados para avaliar o desempenho da comunicação em diferentes cenários operacionais típicos de aplicações agrícolas. Os dados coletados de RSSI e SNR foram tabulados e analisados utilizando o software Real Statistics Resource Pack – Release 8.9.1 (Zaiontz, 2023), um suplemento gratuito para o Microsoft Excel. Para a análise dos dados, aplicaram-se estatísticas descritivas e testes inferenciais ao nível de significância de 5%, sendo previamente verificada a normalidade dos dados para escolha apropriada do teste estatístico (ANOVA ou testes não paramétricos), com o objetivo de identificar a melhor condição de funcionamento dos módulos LoRa na área estudada. Resultados: Os componentes eletrônicos selecionados e utilizados na manufatura dos módulos LoRa atenderam aos objetivos do trabalho, sendo de baixo custo, diminutos e com baixo consumo de energia. A plataforma de prototipagem escolhida foi o Arduino Pro Mini, baseado no microcontrolador ATmega328P, operando a 8 MHz e 3,3 V. O consumo elétrico inicial de 4,53 mA, medido em stand-by, foi otimizado com a retirada do LED de potência, resultando em uma corrente de apenas 0,17 mA, ou seja, uma redução superior a 27 vezes. O transceptor LoRa adotado foi o RA-01SCH, padrão SMD (Surface Mounted Device), da Shenzhen Ai-Thinker Technology Co., Ltd., baseado no chip LLCC68 da SEMTECH, suportando frequências entre 803 e 930 MHz, operando em 3,3 V com potência de transmissão de até 22 dBm e sensibilidade de recepção de até -129 dBm. A antena utilizada foi uma omnidirecional de 1/4 de onda para 915 MHz, com ganho de 5 dBi, acoplada ao transceptor via cabo IPEX-SMA. Para integrar os componentes, foi desenvolvido o layout da PCB (Printed Circuit Board), com pontos de soldagem e entradas para quatro sensores resistivos e/ou digitais e alimentação DC, sendo posteriormente enviado para fabricação em empresa especializada. Finalizadas as placas, foram montadas com os respectivos componentes. Nos ensaios tipo 1, realizados em campo aberto de solo agrícola, os alcances registrados variaram de 160 a 250 m para as 16 combinações de variáveis, obtendo-se valores de RSSI entre -65,4 dBm e -104,9 dBm, sendo consideradas apenas as 10 combinações que atingiram 250 m para análise de melhor condição de funcionamento. Devido à ausência de normalidade nos dados de RSSI e SNR, foi aplicado o teste de Kruskal-Wallis, seguido do teste de Dunn, revelando, para RSSI, a superioridade da combinação 12-7-250-8 sobre diversas outras. Para SNR, destacou-se a combinação 17-7-250-8, indicando uma melhor razão sinal-ruído com maior potência de transmissão. Esses resultados são relevantes para definir os limites e a eficiência da comunicação em visada direta. Nos ensaios tipo 2, com o módulo enterrado em solo seco (18% de umidade volumétrica), o maior alcance foi de 30 m para três combinações (17-7-250-8, 12-7-250-8 e 17-7-250-5), estando de acordo com Hardie e Hoyle (2019), que relatam a influência da profundidade de enterramento e da umidade do solo no alcance de transmissão. Para essas combinações, os valores de RSSI variaram entre -86 e -113 dBm e os de SNR entre 4 e 12,3 dB, sem diferença estatística significativa entre os grupos. Com o solo úmido (31% de umidade volumétrica), o alcance máximo foi de 25 m, atingido por oito combinações, uma redução já esperada conforme o relato de Moiroux-Arvis, Cariou e Chanet (2022). Nessa condição, os valores de RSSI oscilaram entre -77 e -112 dBm e os de SNR entre 1 e 11,8 dB. O teste de Kruskal-Wallis indicou ausência de diferença estatística para SNR, mas para RSSI, o teste de Dunn apontou superioridade da combinação 17-12-500-8 sobre a 12-7-250-8. Esses achados reforçam a influência da umidade do solo na comunicação LoRa e subsidiam futuras otimizações para aplicações em ambiente agrícola. Conclusão: Os ensaios realizados mostraram que a tecnologia LoRa é eficaz para a comunicação tanto em condições de visada direta quanto em ambientes subterrâneos. A análise dos parâmetros TxP, FS, BW e CR indicou uma influência significativa na qualidade do sinal, com sua melhoria ao utilizar valores menores de SF e BW e maiores de CR, com uma maior incerteza em relação aos valores de TxP.Os resultados demonstraram que, em condições de solo seco, a comunicação foi mais eficiente, com maior alcance e menor interferência de ruído, comparado ao solo úmido. O uso dos testes de Kruskal-Wallis e post-hoc de Dunn revelou diferenças significativas entre alguns grupos, permitindo a identificação das melhores condições para a transmissão de dados.Esses achados são essenciais para otimizar e aprimorar os sistemas de comunicação LoRa em aplicações futuras, garantindo maior confiabilidade e desempenho.

Referências

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Arquivos adicionais

Publicado

2025-06-16