Modelagem de bacia hidrográfica e estudo de permeabilidade utilizando HEC-HMS

Autores

  • Aislan Arnoni Paes Júnior
  • Armando Ferreira INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA D ESÃO PAULO - CAMPUS SÃO PAULO

Palavras-chave:

software HEC-HMS; modelagem hidrológica

Resumo

Introdução: As mudanças climáticas vêm sendo reconhecidas como uma das maiores ameaças enfrentadas pelas sociedades contemporâneas, especialmente nas áreas urbanas, onde os impactos se manifestam de maneira mais intensa e visível. Fenômenos como enchentes, tempestades severas, secas prolongadas e elevação da temperatura média são apenas algumas das manifestações desse desequilíbrio ambiental que afeta diretamente a vida das populações urbanas, alterando o cotidiano das cidades e desafiando a capacidade de resposta dos gestores públicos. Segundo dados das Nações Unidas, esses eventos climáticos extremos têm se intensificado nos últimos anos, fruto do aquecimento global e da ação antrópica sobre os ecossistemas naturais. No entanto, apesar da gravidade do problema e da sua ampla repercussão internacional, muitos governos ainda relutam em assumir a responsabilidade por implementar políticas públicas eficazes de adaptação e mitigação das mudanças climáticas. Essa negligência institucional resulta em consequências especialmente devastadoras para as populações em situação de vulnerabilidade social, que são as primeiras a sofrer os efeitos de catástrofes climáticas devido à precariedade das suas condições de moradia, saneamento e infraestrutura básica (ALVES, H. P. F.; 2006). Na cidade de São Paulo, por exemplo, uma das maiores metrópoles da América Latina, a previsão e o gerenciamento eficaz das cheias e inundações seriam estratégias fundamentais para a redução de danos socioambientais. Dados recentes apontam que, entre os meses de novembro de 2022 e abril de 2023, cerca de 771 episódios de inundações foram registrados na capital paulista, evidenciando a urgência da implementação de medidas estruturais voltadas à gestão de riscos hidrológicos (KRUSE, T.; 2024). Nesse contexto, a afirmação de Ribeiro (2014) torna-se especialmente relevante ao declarar que “não é possível aguardar certezas científicas para se adotarem medidas que atenuem os eventuais impactos gerados pelas mudanças climáticas”, destacando a importância de se planejar com base em cenários futuros, mesmo que estes se baseiem em projeções e simulações. A modelagem hidrológica desponta como uma ferramenta estratégica e essencial nesse processo, pois permite simular e prever o comportamento hidrológico de uma bacia, contemplando todas as etapas do ciclo da água, desde a precipitação até o escoamento superficial, infiltração, armazenamento e redistribuição dos recursos hídricos. Essa abordagem é particularmente útil para a formulação de políticas socioambientais que visem a gestão integrada dos recursos hídricos, a redução dos impactos das enchentes e a adaptação das cidades às novas condições climáticas impostas pelo cenário global. Dentre os recursos disponíveis para tal fim, destaca-se o software HEC-HMS (Hydrologic Modeling System), desenvolvido pelo corpo de engenheiros do exército dos Estados Unidos (USACE), que é amplamente utilizado em estudos hidrológicos devido à sua capacidade de realizar simulações detalhadas de bacias hidrográficas, considerando fatores como infiltração de eventos, geração de hidrogramas unitários, transformação do escoamento e roteamento hidrológico. Objetivos: Com base nessas premissas, o presente trabalho tem como objetivo principal aplicar a modelagem hidrológica com o uso do software HEC-HMS a uma bacia hidrográfica localizada na zona norte da cidade de São Paulo, visando compreender os efeitos da impermeabilização do solo sobre o escoamento superficial e os riscos de inundações. Os objetivos específicos envolvem a delimitação da bacia hidrográfica de estudo, a criação de modelos hidrológicos da bacia e a simulação de diferentes cenários de permeabilidade do solo, com variações nos percentuais de área impermeável. Metodologia: A metodologia adotada teve início com a definição da bacia hidrográfica de estudo, utilizando mapas topográficos em formato DWG disponibilizados pelo portal GeoSampa, referentes à cidade de São Paulo. Esses arquivos foram reunidos e editados no software AutoCAD, possibilitando a delimitação precisa da bacia com base nas curvas de nível e pontos topográficos de referência. A delimitação foi realizada a partir da identificação do ponto de exutório, traçando-se as linhas de contorno da bacia conforme o critério do aumento progressivo das cotas altimétricas. Após essa etapa, foram calculados a área total da bacia (em metros quadrados), o comprimento do talvegue principal (em quilômetros) e o desnível altimétrico, utilizando ferramentas do próprio AutoCAD. Para a simulação da precipitação, calculou-se o tempo de concentração (Tc) por meio da fórmula de Kirpich, adotando-se uma chuva com duração de 2 hora (valor próximo ao Tc  mais adequado ao software e ao estudo do trabalho) com início às 10 horas da manhã e período de retorno de 100 anos. A partir dos dados do relatório IDF (Intensidade-Duração-Frequência) da cidade de São Paulo, obteve-se a intensidade da precipitação, a qual foi multiplicada pela duração do evento para estimar a precipitação total (P). Utilizou-se o primeiro quartil da distribuição de Huff para construir a curva de distribuição temporal da chuva, organizada em uma tabela com os valores de tempo, precipitação acumulada e a variação incremental de precipitação entre os intervalos (ΔP). A infiltração inicial foi estimada pela fórmula 0,2 × S, onde S representa a infiltração potencial máxima, calculada com base no método SCS (Soil Conservation Service), utilizando o Curve Number (CN) extraído do Catálogo Nacional de Metadados da Agência Nacional de Águas (ANA). O lag time, também obtido por fórmula, foi incorporado à definição do tempo de concentração da bacia. Com todos os dados definidos, iniciou-se a modelagem no software HEC-HMS, onde a área da bacia foi inserida na aba Subbasin. Para a estimativa de perdas, utilizou-se o método SCS Curve Number (Loss Method) e, para a transformação hidrológica, o método SCS Unit Hydrograph (Transform Method), ambos amplamente reconhecidos pela precisão em ambientes urbanos. Na aba Loss, foram inseridos os valores de CN e infiltração inicial, e realizaram-se simulações com diferentes níveis de impermeabilização (25%, 50% e 70%) no parâmetro Impervious, com o objetivo de avaliar os impactos ambientais causados pelo aumento da cobertura impermeável na resposta hidrológica da bacia. Resultados: No cenário natural, sem áreas impermeáveis, a bacia, com área de 0,06209302 km², apresentou um pico de vazão de 0,5 m³/s às 10h27, perdas por infiltração de 66,02 mm e escoamento direto de 19,98 mm. Com 25% de impermeabilização, o pico de vazão subiu para 1,0 m³/s, registrado às 10h21, o volume infiltrado caiu para 49,51 mm e o escoamento direto aumentou para 36,49 mm. No cenário com 50% de impermeabilização, o pico de vazão sobe para 1,7 m³/s, ocorrido às 10h18, o volume infiltrado diminui para 33,01 mm e o escoamento direto aumenta consideravelmente para 52,99 mm. Finalmente, na simulação com 70% de impermeabilização, o pico de vazão atinge 2,3 m³/s, às 10h15, as perdas por infiltração caem drasticamente para 19,81 mm e o escoamento direto chega a 66,19 mm. Conclusão: Os resultados obtidos evidenciam a forte influência da impermeabilização do solo na resposta hidrológica da bacia de 0,06209302 km². Observou-se que o aumento da cobertura impermeável provocou um crescimento expressivo na vazão de pico e uma redução nas perdas por infiltração. À medida que o percentual de áreas impermeáveis aumentou, houve uma elevação progressiva das vazões máximas e do escoamento superficial, enquanto a infiltração do solo diminuiu de forma significativa. Essa tendência confirma que a impermeabilização intensifica o escoamento direto e reduz a capacidade de recarga do solo, aumentando o risco de enchentes em eventos de chuva intensa. Portanto, os resultados reforçam a necessidade de adoção de práticas de manejo sustentável da água, como a preservação de áreas permeáveis e a implementação de soluções de drenagem urbana, para minimizar os impactos negativos sobre o regime hidrológico.

Referências

ALVES, Humberto Prates da Fonseca. Vulnerabilidade socioambiental na metrópole paulistana: uma análise sociodemográfica das situações de sobreposição espacial de problemas e riscos sociais e ambientais. Revista Brasileira de Estudos de População, v. 23, p. 43–59, 2006. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbepop/a/6LBPFTkP3J5BGsdGLmQRsBg/?format=pdf&lang=pt. Acesso em: 6 dez. 2024. USACE – CORPO DE ENGENHEIROS DO EXÉRCITO DOS EUA. HEC-HMS User’s Manual. Disponível em: https://www.hec.usace.army.mil/confluence/hmsdocs/hmsum/latest. Acesso em: 6 dez. 2024. COSTA RIBEIRO, Wagner. Impactos das mudanças climáticas em cidades no Brasil. CETESB, [s.d.]. Disponível em: https://cetesb.sp.gov.br/aguasinteriores/wp-content/uploads/sites/36/2014/05/ribeiro_impactos.pdf. Acesso em: 6 dez. 2024. KRUSE, Thais. Alagamentos aumentaram 57% na temporada passada de chuvas em São Paulo. Folha de S. Paulo, 2024. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2024/01/alagamentos-aumentaram-57-na-temporada-passada-de-chuvas-em-sao-paulo.shtml. Acesso em: 6 dez. 2024. NAÇÕES UNIDAS. Causas e efeitos das mudanças climáticas. [s.l.]: ONU, [s.d.]. Disponível em: https://www.un.org/pt/climatechange/science/causes-effects-climate-change. Acesso em: 6 dez. 2024.

Arquivos adicionais

Publicado

2025-06-03